Presidente da Assembleia de Deus é acusado de envolvimento em esquema de lavagem com Eduardo Cunha; ministro das Relações Exteriores justificou ação alegando "interesse do País"
O novo ministro das Relações Exteriores do governo Michel Temer, José Serra (PSDB), concedeu o benefício do passaporte diplomático ao presidente da igreja evangélica Assembleia de Deus, Samuel Cassio Ferreira, e à sua mulher, a pastora Keila Campos Ferreira.
Samuel é investigado em um dos inquéritos da Operação Lava Jato e foi acusado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de envolvimento em crimes de lavagem e ocultação de bens em esquema envolvendo o presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
A concessão do benefício, que é válido por três anos, foi publicada na edição desta quarta-feira (18) do "Diário Oficial da União". No texto, o ministro Serra justifica a ação mencionando um decreto que diz que o passaporte diplomático será concedido "às pessoas que [...] devam portá-lo em função do interesse do País".
O passaporte diplomático é um documento concedido ao Presidente da República, a ministros, governadores, ministros do Supremo Tribunal Federal e militares em missões especiais para a Organização das Nações Unidas. Não há menção no texto sobre a concessão do documento a líderes religiosos.
Conforme o próprio Itamaraty, o passaporte diplomático identifica a pessoa que está com ele como "agente do governo". Segundo o ministério, portar esse tipo de documento não concede à pessoa "imunidade diplomática", mas dá privilégios como atendimento preferencial nos postos de imigração e isenção de visto em alguns países.
A assessoria de imprensa do Itamaraty informou que "historicamente", o passaporte diplomático era concedido a cardeais da Igreja Católica e que, a partir do segundo mandato do governo Lula, foi definido que o documento poderia ser entregue a até dois dirigentes máximos de igrejas.
Segundo o Itamaraty, apesar da decisão que beneficia Samuel Cássio e sua mulher, o ministro José Serra teria determinado a "reavaliação" dessa política.
A igreja de Samuel Cássio, em Campinas, recebeu R$ 250 mil do lobista e delator da Lava Jato Julio Camargo, que admitiu que o pagamento era parte da propina de US$ 5 milhões a Cunha referente a contratos de navios-sonda da Petrobras.
Atualmente Cunha é réu no STF justamente no episódio envolvendo esta propina. O parlamentar afastado nega irregularidades. A defesa de Samuel Cássio Ferreira considera o inquérito contra ele desnecessário. A reportagem tentou falar com a assessoria de Serra, mas ninguém atendeu.
É a primeira vez, desde o começo da Operação Lava Jato, que um investigado sem prerrogativa de foro recebe o benefício dado a autoridades. Na semana passada, o Supremo determinou a remessa das investigações envolvendo Samuel Cássio para o juiz Sérgio Moro, responsável pela operação em Curitiba.
*Com informações do Estadão Conteúdo
http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2016-05-18/serra-concede-passaporte-diplomatico-a-pastor-investigado-pela-lava-jato.html