São Paulo – A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aceitou hoje (31) a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 171, de 1993, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. O deputado federal Marcos Rogério (PDT-RO) apresentou voto em separado, pela admissão da PEC, que foi aprovada por 42 deputados, tendo 17 contrários. A proposta foi aprovada após a rejeição do relatório do deputado Luiz Couto (PT-PE), que considerava a proposta inconstitucional, por 43 votos contrários, ante 21 favoráveis.
Para Marcos Rogério, não há nenhum impedimento à tramitação da norma. “A Constituição Federal é feita para gerações. Não pode, portanto, ser vedada a alterações exigidas pela própria população. Não se pode abolir o instituto da maioridade penal, mas é possível sim reduzir essa idade”, defendeu. Um dos argumentos do voto dele é que a redução objetiva "evitar que jovenscometam crimes na certeza da impunidade".
Votaram contra a redução da maioridade os deputados do PT, Psol, PCdoB, PSB e PPS. Já os parlamentares do PSDB, PRB, PSD, PR, DEM, PV foram favoráveis. O Solidariedade, o PDT e o Pros liberaram suas bancadas.
O deputado Felipe Maia (DEM-BA) comemorou a aprovação. “Estamos dando um passo à frente na redução da violência”, afirmou. Para ele, não se pode mais esperar, pois houve 21 anos de debate sobre a PEC 171. “Já naquele momento a pauta estava em sintonia com os desejos da população”, completou.
Na mesma linha, Giovani Cherini, deputado pelo PDT gaúcho, afirmou que se houvesse educação de qualidade, presídios que ressocializassem, não precisaria dessa proposta. “Mas o que me leva a votar é a possibilidade de que isso possa fazer reduzir a violência. Que o medo da punição faça pensar. Os jovens que estão aí preocupados, é só não cometer crime, fazer as coisas certas. Eu não quero colocar nenhum jovem na cadeia. Mas todo ano aumentam os índices em pelo menos 10% do número de jovens que cometem crimes”, afirmou.
O argumento revoltou o deputado Ivan Valente (Psol-SP). “Eu vi argumentos aqui que eu nunca imaginei. Disseram, 'olha, vocês não têm acesso a escola, vocês são pobres, então vocês vão para a cadeia'. Isso é um absurdo. O papel do legislador não é esse. Nós não somos vingadores”, bradou. Contra os argumentos de que o adolescente pode votar e não pode ser punido, Valente lembrou que o voto é aos 16 anos e as punições são a partir dos 12. “Leiam o ECA, lá está descrito.”
Para Valente, o objetivo é justamente manter uma situação de violência e violação de direitos e não enfrentar a violência. “Espero que o bom senso predomine sobre o senso comum. Essa proposta vai aumentar a violência, o preconceito e a intolerância. Tem gente aqui que teme que acabe o medo, porque se elege em cima disso”, afirmou ele, que sugeriu recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), como também fez ontem (30) o deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ), dizendo que pode ser impetrado um mandado de segurança no tribunal.
A inconstitucionalidade da proposta é defendida por organizações como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Associação de Juízes para a Democracia (AJD), a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e o Instituto dos Advogados do Brasil (IAB). A OAB já indicou que deve propor ação no STF contra a proposta.
Para Molon, “é um imenso contrassenso” mandar os jovens para um sistema falido alegando enfrentar a violência e buscar ressocializá-los. “Esta comissão não pode rasgar a constituição. Mesmo sendo algo que, digamos, a maioria do povo brasileiro apoia”, disse Molon. E destacou que grandes juristas brasileiros são contrários à proposta, por se tratar de cláusula pétrea, como Dalmo de Abreu Dallari, Alexandre de Moraes, atual secretário da Segurança Pública paulista, Damázio de Jesus, Luiz Flávio Gomes, José Affonso da Silva, e o ex-ministro do STF Carlos Ayres Britto.
O deputado retomou várias vezes o argumento de que é falsa a justificativa de que está se enfrentando a impunidade. “Não se trata de que o adolescente não seja responsabilizado. Inclusive, a eles não cabe o regime de progressão de pena. Ou seja, o jovem pode ficar mais tempo internado do que um adulto pelo mesmo crime”, defendeu Molon.
Durante a votação, o presidente da CCJ, deputado federal Arthur Lira (PP-AL) ameaçou, várias vezes, retirar do plenário os manifestantes contrários a proposta que entoavam palavras de ordem contra a PEC 171. “Não, não, não vamos aceitar, primeiro negam escola agora querem encarcerar”.
Trâmite
Agora, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) – favorável à proposta –, deve criar uma comissão especial para analisar a proposta. O grupo terá o prazo de 40 sessões do plenário para fazer o trabalho. Depois disso, o projeto tem de passar por duas votações plenárias, em que deve ser aprovado por 3/5 dos parlamentares (308 deputados).
Aprovada, a matéria vai para o Senado, onde será analisada pela CCJ da casa e terá de passar por mais duas votações e ser aprovada por 54 senadores. Se o texto for alterado, a PEC volta para a Câmara. O processo só termina quando as duas casas concordarem sobre a redação final da proposta.
Movimentos sociais estão organizando campanhas em todo o país e nas redes sociais para esclarecer a população sobre a situação de vulnerabilidade da maior parcela da população jovem do Brasil. “Precisamos sair desse lugar comum de dizer que não existe punição e que a lei não funciona. Existe sim a responsabilização. Só que a lei nunca foi aplicada em sua plenitude. E não é jogar o texto fora e colocar os jovens em cadeias comuns que vai resolver o problema”, afirmou o militante da União de Núcleos de Educação Popular para Negros e Classe Trabalhadora (Uneafro) Douglas Belchior.
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