Parece que o espírito olímpico e o fogo de Zeus vieram em missão, para elucidar o oculto e iluminar as mentes desprovidas de sabedoria.
Primeiramente fora, Temer! Segundo, o espetáculo que foi a cerimônia de abertura dos jogos olímpicos revelou para o mundo a capacidade de organização do nosso país, quando quer ser organizado. É inegável que boa parte do mundo que apostava no fracasso da cerimônia de abertura, teve que chupar uma manga bem doce, cultivada no quintal da criatividade artística e se lambuzar com um show jamais visto em outra edição de jogos olímpicos. Isso não significa que os jogos deveriam ter sido realizados aqui. Acho que não. Todo esse investimento poderia ter sido aplicado em saúde, educação e saneamento básico, por exemplo. Mas não podemos ser injustos. Foi sim um espetáculo.
Mas como o show não pode parar, temos mais um espetáculo entrando em cartaz no nosso país. Estou falando do caso de assédio sexual envolvendo o pastor e deputado Marco Feliciano, do PSC, que é acusado por uma jovem militante do seu partido de ter tido com ela relações sexuais não consentidas e de tê-la agredido fisicamente. Um áudio por ela mesmo gravado foi vazado e nele ouvimos um diálogo entre ela e o assessor do deputado, que tenta, digamos, lhe oferecer um agrado em trocado seu silêncio. Logo após a divulgação desse áudio, a jovem gravou um vídeo no qual dizia que tudo não passava de mentira e armação dos esquerdistas petralhas para sujar a imagem do deputado em época de eleição.
Mas além de toda a torcida do Flamengo, parece que ela mesma não acreditou na sua declaração e resolveu contar a verdade. Em outro vídeo publicado numa matéria da revista Veja (http://vejasp.abril.com.br/materia/jovem-conta-detalhes-de-caso-de-assedio-envolvendo-pastor-marco-feliciano) a jovem abre o jogo e revela que foi coagida a gravar o vídeo de desagravo ao pastor, inclusive recebendo a visita do seu assessor, que portando uma arma (segundo relatos dela mesma), a obrigou a gravar o falso depoimento. No mesmo vídeo ela ainda relata a tentativa de suborno que sofreu do pastor Everaldo, presidente do partido, que lhe ofereceu “um saco de dinheiro” para que ela mantivesse sigilo sobre o caso e a proposta feita pelo deputado Marco Feliciano, que lhe daria um cargo no partido com um salário de 15 mil reais (que ela diz no vídeo que achou pouco. Oi?), caso ela aceitasse exercer também o “cargo” de sua amante.
Como se não bastasse a arrogância pessoal, a conduta religiosa duvidosa, as várias declarações preconceituosas e as artimanhas políticas nas quais o deputado em questão sempre esteve envolvido, temos agora uma acusação de estupro contra um homem que se diz um profeta e digno de toda a autoridade e santidade que, segundo ele, Deus lhe conferiu. Um defensor da família, que ataca, julga e condena abertamente o comportamento de quem não segue a sua doutrina. Um homem que já sentenciou em uma de suas pregações que os católicos (como eu) irão para o inferno. Um homem que ataca a várias outras religiões em suas pregações, como se isso tornasse a ele e os seus seguidores, espiritualmente superiores aos demais. Esse mesmo senhor que já presidiu a comissão de direitos humanos da câmara, levantando a bandei ra da preservação da família cristã. Ele mesmo que também foi um dos artífices do golpe e votou a favor do impeachment da presidente Dilma pontuando o seu voto com “Tchau, querida!”
O mesmo deputado que profetizou debochadamente que Lula estaria preso em 2018 e que, portanto, não seria páreo para uma disputa contra a sua chapa presidencial, na qual ele é candidato à vice e tem Jair Bolsonaro como postulante a presidência. O mesmo deputado e pastor que agora pode ser indiciado e preso por tentativa de estupro, se a nossa justiça não fizer vista grossa para o caso, como sempre faz quando o suposto criminoso é da direita. Um homem que atrai uma multidão de ovelhas para a sua igreja e lhes oferece como bálsamo a mentira que ele tem dentro de si. O seu cinismo e capacidade de manipular impressionam, mas não deveriam convencer. Pelo menos a quem tem o mínimo de bom senso e de capacidade de perceber que o seu discurso não combina com as suas atitudes. Não me surpreende em nada essa acusação, o que me causa espanto é ainda perceber que muitos tentam defender o indefensável.
Espero que não me interpretem mal, mas a jovem não me pareceu tão ingênua assim. Por que vazou o áudio? Ou ela omitia o fato para todo o sempre ou trazia a verdade a tona sem rodeios. O medo não deve ser maior do que a disposição em defender a própria honra. Dizer que achou 15 mil reais pouco? Teria sido um lapso? Talvez. Sem julgamentos ou conclusões precipitadas, mas eu gostaria de fazer alguns questionamentos. O que o deputado Bolsonaro acha disso tudo. Será que ele pediria castração química para o seu vice-presidente? E o que pensa a igreja, os seus fiéis seguidores e os defensores da família, da moral e dos bons costumes? Será que vai rolar um panelaço gospel? Será que vão entrar com um pedido de impeachment junto a Deus contra o pastor? Teria a ele a sua unção cassada? Haverá manifes tações em prol da verdade? Será que vai rolar uma sessão do descarrego coercitiva? Será que outros grampos telefônicos serão divulgados na mídia? Haverá delação abençoada, digo, premiada?
Deixo aqui o meu sincero respeito à família do pastor e deputado. Esposa e filhas não merecem passar por tamanha humilhação e exposição. Elas devem ser preservadas. Quanto a jovem vítima do assédio, entendo que ela deve agradecer a Deus por ele não ter lhe pedido o cartão de crédito e a senha. O estrago seria ainda pior. Ao pastor e deputado, que segundo sua assessoria, ficou de joelhos em seu gabinete pedindo a Deus que revelasse ao mundo toda a verdade (E parece que ele atendeu ao seu pedido), eu estimo a pronta recuperação da sua vergonha na cara. Depois, é claro, de ser submetido a uma sessão de “cura hétero” para aprender a “aquietar o pintinho” e de ser punido de forma exemplar por nossa rigorosíssima justiça brasileira. A mesma que costuma lavar a jato toda corrupção e todos os corruptos. A justiça divina já está fazendo a sua parte, embora muitos não percebam.
Amém?