Em sua passagem pela China para a reunião do G-20 o presidente Michel Temer protagonizou uma cena inusitada: foi a um shopping de Hangzhou para comprar um par de sapatos chineses. De quebra, levou um cachorrinho-robô made inChina para seu filho de 7 anos, o Michelzinho. A cena foi registrada pela Rádio Internacional China, em cujo site o presidente aparece posando junto à vendedora.
O inusitado da cena é que, em geral, presidentes fazem viagens internacionais para, sobretudo, “vender” seus países. E não, pelo contrário, servir de garotos-propaganda para os produtos dos competidores – ainda mais chineses em um momento em que o Brasil passa por grave recessão e a geração de empregos aqui, e não na China, deveria ser a prioridade absoluta das autoridades nacionais. Aos jornalistas brasileiros Temer afirmou que a sola do seu sapato havia quebrado, daí a necessidade de um substituto. É difícil acreditar que um presidente saia em tour internacional com apenas um par de sapatos, mas, ainda assim, era necessário ir pessoalmente?
O episódio, é claro, é um mero incidente. Um detalhe. Mas o que transparece é que Temer, que completará em breve 76 anos, ainda parece agir na presidência como se fosse o que sempre foi na política: um hábil homem dos bastidores. Que faz da eterna ambiguidade uma força que talvez funcione melhor sob o beneplácito das sombras – e não sob os holofotes da presidência onde o simbólico-público opera 24 horas por dia. Temer sabia ou não sabia da manobra de Renan no Senado que fatiou, e pode agora judicializar, o impeachment de Dilma? Fato “inadmissível” disse ele, para dias depois resumir como “pequeno embaraço”. Sobre a votação do reajuste do Judiciário diz que vai aguardar a votação no Senado para depois sancionar ou, pelo contrário, vetar. Sim e não ao mesmo tempo. Tanto faz?
Temer é um colecionador de pequenos incidentes. De pequenos enigmas que no final se revelam apenas isto: enigmas. Ou seriam outra coisa? Se autointitulou um “vice decorativo” na tal carta “em caráter pessoal” a Dilma em dezembro de 2015, quando nas entrelinhas se empenhava para colocar lenha na fogueira de uma crise política que vinha atingindo seu ápice. Ao comprar calçados chineses em sua primeira viagem internacional – e ao passar a impressão de que não se dá conta da dimensão simbólica do gesto – Temer se comporta como presidente decorativo. Como presidente que é e não é presidente. “Foi sem querer querendo”, poderia ser um de seus lemas, parafraseando bordão de conhecido humorístico da TV mexicana.
Um dos interesses de Temer na pressa da votação do impeachment no Senado foi justamente estar a postos na China no G-20, lançando-se, assim, como presidente de todos os brasileiros no (quase sempre favorável) cenário dos encontros internacionais. Tapetes vermelhos, apertos de mão com líderes mundiais, transmitindo desde o estrangeiro a imagem de comando do país. Mas aí a sola do sapato quebrou. Mas quebrou mesmo?
Siga-me no twitter! (@rogerjord)
Imagem:China Radio Internacional
loading...
Ver as imagens A bandeira da antecipação da eleição presidencial, que vem ganhando visibilidade com as manifestações de Fora Temer!, encontra respaldo na opinião pública. A maioria dos brasileiros, conforme indicaram seguidas pesquisas desde o...
Cúpula do PMDB no Senado dá sinais de que pode mudar de lado:printConsiderada o fiel da balança na condução do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso Nacional, a cúpula do PMDB do Senado começa a mostrar sinais de divisão....
SÃO PAULO - Advogado de 75 anos, Michel Temer será presidente da República se o Senado aprovar hoje o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Para apresentar essa figura aos seus leitores, o periódico norte-americano Financial Times fez um perfil...
BRASÍLIA (Reuters) - O presidente em exercício, Michel Temer, disse nesta sexta-feira que decidiu falar a jornais estrangeiros para na véspera para rebater “agressões” à Vice-Presidência que, segundo ele, estão atingindo a imagem do Brasil.“Achei...
Separação das contas de Dilma e Temer no TSE desmoralizaria as instituições e reforçaria tese de golpe26255Temer faz campanha com Dilma em Curitiba, em 2014. Foto: André Rodrigues/Gazeta do PovoNo mesmo dia em que ministros do Supremo Tribunal Federal...