A chave de tudo
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A chave de tudo


A chave de tudo

A resposta para todas as perguntas. A equação que resolve todas as questões. Dos sólidos de Platão às supercordas da física atual, refaça conosco a fantástica viagem da ciência em busca do seu Santo Graal: a teoria de tudo






por Helio Gurovitz.

http://super.abril.com.br/ciencia/chave-tudo-443721.shtml


Pitágoras dizia que era a harmonia musical. Platão acreditava nos sólidos perfeitos. Newton e Einstein, no espaço, no movimento e na energia. Os físicos de hoje, em – o nome é este mesmo – supercordas. Desde que o mundo é mundo, os cientistas sonham com o dia em que toda a realidade caberá numa formulação simples e elegante, com o momento em que tudo o que existe, existiu ou existirá poderá ser entendido e explicado por uma espécie de teoria de tudo: completa, imune a contradições e paradoxos e, acima de qualquer suspeita, real. Até hoje, quem teve mais sucesso na empreitada foi o finado Tim Maia, que resumiu numa única frase – “tudo é tudo e nada é nada” – a confusão sem fim que é explicar este ou qualquer outro Universo. Mas as tentativas dos físicos e matemáticos em busca da teoria de tudo, embora não caibam em detalhes nestas poucas páginas, contam uma das histórias mais fascinantes do pensamento humano, de seus ideais e seu alcance, de suas conquistas e limitações.

“Tudo são números.” Atribuída a Pitágoras de Samos, na Grécia antiga, essa frase pode ser considerada o início da busca dos homens por uma explicação lógica, precisa e racional para os fenômenos da natureza. Pitágoras, afirmam os especialistas, teria descoberto que harmonias sonoras podiam ser explicadas pelas proporções entre o comprimento das cordas musicais. Com base nos números, construiu todo um arcabouço de idéias matemáticas que resultaram no célebre teorema de Pitágoras, aquele mesmo que todos aprendemos na escola, o dos catetos e da hipotenusa (que, em grego antigo, também significa “a corda estendida”). Os intervalos musicais descobertos pelos pitagóricos em suas cordas estendidas (a oitava, a quinta e a quarta) estão presentes até hoje na música ocidental e serviram para que eles construíssem um modelo para o Universo em que tudo era resultado da “harmonia das esferas”, fruto dos números.
Cordas vibrando e gerando diferentes harmonias também são a base da teoria mais atual da física moderna para explicar o Universo, chamada teoria das supercordas. Como as idéias de Pitágoras influenciaram físicos do século 21?
É preciso ir devagar. Primeiro, as idéias pitagóricas tiveram profunda influência sobre aquele que é tido como o primeiro filósofo grego: Platão. É dele a concepção que norteia até hoje a ciência moderna: a noção de que as idéias existem independentemente das coisas e de que é função do pensamento tentar pescar no mundo das idéias as explicações e teorias. Sobre essa noção foi construída toda uma visão de que a geometria e a matemática têm, por assim dizer, vida própria. Que elas são reais, independentemente da nossa capacidade de entendê-las. O modelo de Universo de Platão, descrito no diálogo Timeu, ainda não falava em átomos ou partículas, tampouco em cordas ou supercordas. Para ele, o mundo era resultado de formas geométricas perfeitas (os cinco sólidos de Platão que ilustram estas páginas). Quatro deles – hexaedro, tetradedro, octaedro e icosaedro – seriam constituintes dos quatro elementos: terra, fogo, ar e água, respectivamente.
O dodecaedro representava o quinto elemento, ou quintessência, por ser o único que não poderia ser gerado a partir de triângulos (o triângulo era uma espécie de partícula fundamental para Platão). O dodecaedro deveria, portanto, estar presente em tudo. Com a descoberta dos átomos e partículas fundamentais, no século 19, o Universo de Platão rolou ribanceira abaixo. Entretanto, até hoje, toda e qualquer teoria que se proponha a explicar tudo deve a Platão a noção de que, no tal mundo das idéias, estão as explicações. Caberia a nós, meros mortais, buscá-las.
Mais de 2 mil anos depois das fantasias platônicas, o inglês Isaac Newton escreveu no monumental Principia Mathematica, base da física clássica: “Toda a diversidade das coisas criadas, cada uma em seu lugar e tempo, só poderia ter surgido das idéias e da vontade de um ser necessariamente existente”. Mais que um simples eco de Platão, também podemos ler em Newton o desejo de ver o mundo por meio da geometria e dos números, como Pitágoras. O Universo newtoniano funcionava com base na atração entre os corpos, regida pela lei da gravitação. Era a gravidade que explicava todos os movimentos. Newton também descreveu a luz como uma sucessão de partículas sujeitas às suas leis. Ao contrário das idéias dos gregos, suas teses foram verificadas experimentalmente. E, a partir daí, as estrelas e as esferas nunca mais foram as mesmas.
O poder das idéias newtonianas ao prever o movimento dos corpos celestes e ao dar nascimento à mecânica e à engenharia moderna foi tão grande, que ficou célebre a constatação do físico britânico William Thomson, o Lord Kelvin, no final do século 19, de que nada mais havia a se descobrir na física, só restava fazer medições mais precisas. “As futuras verdades da física devem ser procuradas na sexta casa decimal”, teria dito Kelvin. A tal teoria de tudo estava pronta, baseada nas idéias de Newton sobre o movimento e a luz e em algumas outras teorias de James Maxwell e Kelvin sobre a transmissão de calor, eletricidade e energia então em voga.
Kelvin, hoje sabemos, estava enganado. Redonda, profunda e vergonhosamente enganado. Não só havia muito, muito mais a descobrir, como o século 20 virou de cabeça para baixo toda a física pensada nos 2 500 anos anteriores (dos gregos a Newton) e recolocou o sonho de uma teoria de tudo no mundo dos sonhos – de onde, por sinal, ele só tem tentado sair recentemente com a tal teoria das supercordas. As ambições de físicos, matemáticos e de todos os herdeiros dos ideais platônicos foram postas em xeque por uma série de dificuldades teóricas e contradições experimentais. Algumas delas foram resolvidas, outras permanecem abertas até hoje.
E o sucesso de teorias como a das supercordas para resolvê-las, ainda que possa até ser verificado em um futuro não muito distante, não deve nos iludir: tudo continua sendo coisa demais para caber numa fórmula e, talvez, possa ser econômica ou experimentalmente inviável verificar muitas das idéias hoje candidatas a teoria de tudo, a última e derradeira explicação para o princípio, o meio e o fim deste Universo – e também de outros.
No século 19, a primeira contradição observada nos princípios de Newton se referia à velocidade da luz. A mecânica newtoniana estabelecia que as velocidades de dois corpos em movimento em relação a um observador devem ser somadas. Se algo em movimento emite luz, então a velocidade da luz emitida deveria ser somada à velocidade do movimento em relação ao observador parado. Só que isso não correspondia às conclusões derivadas das teorias desenvolvidas para a eletricidade. Albert Einstein resolveu esse paradoxo por meio da teoria da relatividade restrita, em que ele postulava que a velocidade da luz era constante e não poderia ser somada a outras velocidades. Nada poderia ser acelerado acima da velocidade da luz. O trabalho de Einstein também confirmou a natureza corpuscular da luz, e as partículas que a constituíam foram chamadas de fótons.
Só que a presença dos fótons davam margem a uma outra contradição com as idéias de Newton e seus seguidores. Ei-la: se nada pode ser acelerado além da velocidade da luz e se os corpos se atraem de acordo com as leis da gravitação, como explicar que essa atração ocorra instantaneamente? Como a informação gravitacional poderia viajar de um corpo a outro a uma velocidade infinita, portanto superior à dos fótons de luz? Para resolver essa contradição, Einstein teve de modificar completamente as teorias sobre a gravitação. Ele postulou que o universo que todos conhecemos com três dimensões – em que todos os objetos têm comprimento, largura e altura – é, na verdade, a manifestação concreta de um outro universo, o real, em que existe uma quarta dimensão: o tempo. Nesse universo de quatro dimensões, chamado espaço-tempo, toda matéria causa uma deformação, ou uma espécie de curvatura. A força gravitacional seria, de acordo com Einstein, a manifestação de todas as curvaturas geradas pela matéria.
A atração entre os corpos seria, portanto, uma propriedade geométrica do espaço-tempo: eles como que “escorregariam” um em direção ao outro por causa dessas curvaturas. Quando foi possível medir experimentalmente o desvio de um raio de luz no céu de um eclipse, supostamente causado pela curvatura do espaço-tempo gerada pela massa do Sol, Einstein se tornou uma celebridade mundial. A física de Newton não passava de um caso especial de uma teoria mais abrangente para explicar todas as coisas: a teoria da relatividade geral de Albert Einstein.
Mas o físico alemão naturalizado americano não estava satisfeito. Havia uma série de outras contradições que suas teorias eram incapazes de resolver. As partículas minúsculas – como o fóton, a partícula de luz, ou o elétron, a partícula concebida para explicar a eletricidade e o magnetismo – eram dotadas de um comportamento extremamente bizarro. Em 1803, Thomas Young havia demonstrado que, ao deixar luz atravessar duas minúsculas fendas e depois iluminar um filme fotográfico do outro lado, era possível verificar no filme um padrão de interferência entre os dois raios de luz. Para explicar isso, os físicos imaginavam que as partículas de luz poderiam se propagar como ondas que interferiam umas nas outras, assim como as ondas sonoras. No século 20, porém, foi realizado um outro experimento, em que se deixava apenas um fóton de luz atravessar cada fenda.
Para surpresa de todos, ainda foi possível observar o padrão de interferência no filme. Isso significava que cada partícula de luz teria, ela própria, uma natureza ondulatória, capaz de interferir no movimento das outras.
Para explicar a natureza dessas partículas e como elas poderiam se mover e trocar energia, os físicos desenvolveram uma teoria chamada mecânica quântica. Ela tinha duas características peculiares. A primeira era postular que tais partículas só poderiam ocupar um certo número de estados energéticos fixos e que elas trocariam energia por meio de pacotes, batizados quanta. Assim, o fóton deixava de ser uma mera partícula de luz para se tornar o quanta das ondas de luz. A segunda característica era que, desenvolvidas sobretudo por Niels Bohr, Werner Heisenberg e Paul Dirac, as equações por meio das quais a mecânica quântica descrevia o movimento de “ondas-partículas” como fótons e elétrons postulavam, devido à natureza ambivalente desses objetos, que era impossível conhecer simultaneamente sua posição e sua velocidade.
A medição precisa de uma dessas quantidades implicava incerteza na medição da outra, que se transformava apenas numa gama de probabilidades. Conhecido como princípio da incerteza, essa tese de Heisenberg revoltava físicos como o próprio Einstein.
Ele tentou minar os pressupostos da mecânica quântica por meio de um experimento imaginário, concebido com seus colegas Nathan Rosen e Boris Podolsky. O experimento Einstein-Podolsky-Rosen, ou EPR, como ficou conhecido, imaginava o decaimento de uma partícula em duas outras que, de acordo com as equações quânticas, gerariam duas nuvens de probabilidades no espaço, mas girariam em sentidos opostos quando detectadas. Depois de viajar por milhões de anos-luz, Einstein, Podolsky e Rosen supuseram que um observador medisse uma das partículas, de modo que ela assumisse um dos estados previstos em sua onda de probabilidades. Ora, por força das leis do decaimento, a outra partícula deveria instantaneamente assumir o estado oposto, isto é, girar na direção contrária. Mas como ela saberia isso imediatamente a milhões de anos-luz de distância, se nada pode ultrapassar a velocidade da luz? Estava aí uma contradição evidente entre a relatividade de Einstein e a mecânica quântica.
Portanto, afimavam Einstein, Podolsky e Rosen, o princípio da incerteza deveria estar errado e toda a mecânica quântica precisaria ser revista.
Seguiu-se a isso um intenso debate entre Einstein e Bohr, talvez o maior da física do século 20. Um debate que teve conseqüências decisivas sobre a concepção de ciência derivada das idéias de Platão e sobre o possível alcance de uma teoria de tudo. Pela primeira vez desde Platão, havia um ingrediente novo. O mundo das idéias, embora representado pela nuvem de probabilidades das partículas quânticas, não dava conta de prever tudo.
O observador, ou a simples existência de um observador, interferia e alterava o resultado do experimento. O conhecimento sobre um dado da natureza poderia modificar a própria natureza. Era isso que Einstein não conseguia aceitar. Bohr e seus seguidores acreditavam que o presente só é capaz de nos dar conhecimento sobre diferentes futuros possíveis. Tudo o que podemos fazer, diziam eles, é calcular probabilidades. Mais que isso, Bohr ainda afirmava que não é necessariamente verdade que todas as coisas tenham propriedades como velocidade, posição, tamanho ou massa com valores definidos em todos os momentos. Einstein, com sua célebre frase “não acredito que Deus jogue dados com o universo”, era contrário às duas posições. Ele tinha uma postura ao mesmo tempo realista (tudo pode ser medido) e determinista (tudo pode ser previsto teoricamente). Bohr era a um só tempo antideterminista e anti-realista.
Para ele, tudo aquilo a que a ciência poderia almejar era o conhecimento das probabilidades de resultados experimentais. Para Einstein, era a compreensão dos segredos por trás do funcionamento da natureza, de por que as coisas eram de um jeito e não de outro. A questão de Bohr era apenas “o quê?”; a de Einstein, “por quê?”. E Einstein perdeu.
Ele queria descobrir uma teoria capaz de unificar as forças conhecidas até então, gravitação e eletromagnetismo, numa única força. Mas morreu sem formular sua tão sonhada teoria do campo unificado. E, à medida que as teorias quânticas começaram a ser verificadas experimentalmente, toda a concepção científica de Einstein foi posta em xeque. A unificação das forças numa espécie de teoria de tudo não deixava, no entanto, de ser um sonho da física. A interação das partículas, descobriram os físicos do século 20, se dava no universo por meio não de duas, mas de quatro forças: a força nuclear forte (tão forte que é responsável pela energia solar e pela coesão do átomo de hidrogênio que se desfaz na explosão de uma bomba H), a força nuclear fraca (responsável pela radioatividade e por alguns tipos de radiação e fenômenos físico-químicos), a força eletromagnética (presente na eletricidade e nos ímãs) e a força gravitacional.
Os físicos modernos já conseguiram, no ramo da física conhecido como teoria quântica de campos, integrar as três primeiras forças teoricamente e mostrar que elas são resultado de uma única “superforça”, chamada força eletrofraca.
Com base nas tais probabilidades de Bohr e Heisenberg e na unificação das três forças, os físicos também mapearam toda a fauna de partículas elementares, naquilo que ficou conhecido como modelo-padrão. De acordo com esse modelo, todas as partículas quânticas (não só fótons e elétrons, mas também os prótons e nêutrons que formam o núcleo dos átomos e toda uma fauna estranha de múons, bósons e quejandos que os físicos descobrem nos aceleradores de partículas) são derivadas de três famílias de partículas ainda mais elementares, chamadas léptons e quarks (e também há uma partícula adicional chamada bóson de Higgs). Todos os léptons e quarks previstos pelo modelo-padrão já foram verificados experimentalmente nos aceleradores de partículas. Além disso, o modelo-padrão e a teoria quântica de campos são perfeitamente compatíveis com a teoria da relatividade restrita de Einstein, aquela que postula que nada pode ultrapassar a velocidade da luz.
Só falta integrar a isso tudo a força gravitacional, a teoria da relatividade geral e a curvatura do espaço-tempo. Ou faltava. Apesar de o paradoxo EPR continuar sendo um exemplo da contradição fundamental entre a relatividade geral e a teoria quântica de campos, nas duas últimas décadas a tal teoria das supercordas tem dado esperança aos físicos de que eles, finalmente, estejam próximos de uma teoria de tudo.
Os pioneiros da teoria das supercordas, John Schwarz, Michael Green e Yoichiro Nambu, imaginam que o universo não seja formado por pontos em um espaço-tempo de quatro dimensões, como o imaginado por Einstein. Para eles, vivemos em um mundo de dez dimensões, em que minúsculas cordas, cujo comprimento é da ordem de um decilionésimo de centímetro (seriam necessárias um decilhão – ou 1 seguido de 33 zeros – de cordas para formar 1 centímetro), vibram nas dez dimensões para formar todas as partículas do modelo padrão e tudo o que conhecemos. Nada muito diferente do que Pitágoras imaginava há 2 500 anos com sua música das esferas. O que eles conseguiram com isso foi alcançar a integração da força gravitacional à teoria quântica de campos. Como? Além das quatro dimensões do espaço-tempo relativístico de Einstein, haveria outras seis, presentes no princípio do universo, que teriam sido compactadas a uma escala minúscula no mundo einsteiniano que somos capazes de verificar experimentalmente.
A vibração das cordas nessas seis dimensões seria responsável pelas propriedades quânticas, como a dualidade onda-partícula.
E, dessa forma, estaria alcançada a teoria do campo unificado tão sonhada por Einstein. A questão central é que, muito provavelmente, essa teoria não pode ser provada por meio de experiências nos aceleradores de partículas, cujo alcance se restringe a fenômenos da ordem de dez quatrilionésimos de centímetro (as cordas teriam de ser um quatrilhão – ou 1 seguido de 16 zeros – de vezes maiores para ser detectadas). Para ter uma prova perfeita da existência das cordas e das leis de simetrias que a regem seria preciso um nível de energia comparável ao do Big Bang, a explosão que, de acordo com a maioria dos físicos teóricos, teria dado origem ao universo.
A tentativa deles, portanto, é projetar algum tipo de experimento que seja viável com os aceleradores de partículas para detectar pelo menos pistas de que as tais cordas existam, como ressonâncias de suas vibrações. Porém, por enquanto, tudo isso não ultrapassou o campo das especulações.
E, se a teoria das supercordas é uma legítima reedição dos ideais de Pitágoras e Einstein, numa formulação compatível com o conhecimento experimental do século 21, também não faltam concepções mais ousadas para uma teoria de tudo. A mais criativa foi elaborada pelo americano Max Tegmark. Ele na verdade radicalizou a visão platônica de que as idéias existem independentemente da nossa capacidade de conhecê-las. Para Tegmark, toda e qualquer formulação matemática existe fisicamente. Assim, o teorema de Pitágoras, por exemplo, corresponde a um universo como o nosso, que existe de fato. O único senão é que esse universo talvez não tenha nenhum habitante com consciência, capaz de descrever seus fenômenos físicos. Dessa forma, se quisermos entender as leis do universo, precisamos não apenas considerar a interferência de observadores hipotéticos nos fenômenos físicos, mas entender as próprias leis da vida desses observadores.
“As condições para a vida especificarão as equações que governam nosso universo e nos dirão por que nenhuma outra lei é válida ou aplicável”, diz Tegmark. Nosso universo não passaria de uma caixinha dentro de todas as possíveis teorias matemáticas, mas uma caixinha que foi capaz de gerar estruturas autoconscientes (nós). Todas as demais caixinhas também corresponderiam a realidades físicas. Além de as idéias habitarem um mundo independente, como queria Platão, nós não passaríamos de fruto das idéias, assim como a tradição oriental diz que o mundo não passa de um sonho de Buda.
Não é nova a idéia de múltiplos universos, ou de que na verdade não faz sentido falar num universo, mas apenas em multiversos. Para explicar o comportamento bizarro das partículas quânticas, por exemplo, havia duas interpretações: a de Copenhague, defendida pelo dinamarquês Bohr, que postulava a existência da nuvem de probabilidades dos possíveis estados, e a de Budapeste, defendida pelo húngaro John von Neumann, segundo a qual as possibilidades de trajetórias e velocidades de partículas existiam em múltiplos universos. Enquanto os defensores da interpretação de Copenhague enfatizavam nossa inerente limitação para detectar os fenômenos (pois as observações geram o colapso da nuvem de probabilidades em um único estado), os que acreditavam na interpretação de Budapeste afirmavam que as medições, e o conseqüente colapso, só ocorrem de fato dentro do cérebro. Seria, portanto, nossa mente que faz as partículas do universo adotarem um caminho e não o outro, uma posição e não a outra.
E, na verdade, elas adotariam todas as possibilidades em múltiplos universos. O quanto da nossa capacidade de entender e resumir tudo por meio do cérebro limita as possibilidades da nossa compreensão ou o quanto essa compreensão não passa de um reflexo de nossas próprias estruturas mentais é uma questão sem resposta. Não há uma explicação para o fenômeno da consciência, assim como ainda não há teoria capaz de explicar tudo o que há no universo. Se os dois sonhos são no fundo reflexo da mesma ilusão matemática, nem Tim Maia soube dizer.

Teóricos de tudo

Pitágoras (570-497 a.C.)
A “harmonia das esferas” era para os pitagóricos a origem de tudo. Com base na proporção entre os comprimentos das cordas musicais, Pitágoras descobriu os intervalos entre notas existentes até hoje na música. Ele também buscava nos números a explicação para o funcionamento de todo o universo.
Platão (427-348 a.C.)
Para ele, a explicação de como tudo existia estava nos cinco sólidos perfeitos: cubo, tetraedro, octaedro, icosaedro e dodecaedro. Os quatro primeiros estavam por trás dos quatro elementos (terra, fogo, ar e água), e ao dodecaedro correspondia um quinto elemento, a quintessência presente em tudo. Apesar de a teoria de Platão parecer, hoje, fantasiosa, a ciência moderna deve a ele a noção de que existem explicações independentes para as coisas.
Newton (1643-1727)
Fez uma descrição do universo que partia de equações matemáticas para explicar como os corpos se moviam e trocavam energia. Suas principais teorias foram capazes, pela primeira vez, de explicar a força gravitacional e acabaram dando origem a todo o avanço tecnológico por trás da Revolução Industrial.
Einstein (1879-1955)
No século 19, a experimentação mostrou que havia buracos nas teorias newtonianas. Einstein ampliou-as com as teorias da relatividade restrita e geral, postulando que nada poderia ultrapassar a velocidade da luz. Mas ele não conseguiu realizar seu sonho: construir uma teoria capaz de explicar todas as forças do universo por meio de uma única “superforça”. A relatividade geral se mostrou contraditória quando aplicada ao mundo das partículas elementares. Hoje, a teoria das supercordas está perto de unir a força gravitacional e a relatividade geral com as demais forças do universo e realizar o sonho de Einstein.
Niels Bohr (1885-1962)
Ao explorar os mistérios do átomo, ele entrou em choque com a visão einsteiniana de que a missão da ciência era desvendar o porquê dos fenômenos naturais. Para Bohr, o máximo que se poderia obter é uma teoria que descreve como as coisas são.
Max Tegmark (1967)
O radical físico americano acredita que toda teoria matemática tem existência física em algum universo. Mas só em alguns deles haveria vida autoconsciente capaz de explicá-los. “Não somos nós que criamos a matemática”, diz Tegmark, “ foi a matemática que nos criou”.

Para saber mais

Na livraria
Fire in the Mind, George Johnson, First Vintage Books, 1996
Sonhos de uma Teoria Final, Steven Weinberg, Rocco, 1994
Na internet:
www.hep.upenn.edu/~max/toe.html
www.theory.caltech.edu/people/jhs/strings/index.html
www.msu.edu/user/malonemi/ibs333/quantum.html
www.flash.net/~csmith0/theryall.htm
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