O presidente interino Michel Temer tem um plano duro: segurar gastos com saúde, educação e aposentadorias para facilitar o pagamento da dívida pública. Um plano impopular, como reconhece um colaborador “temerista”, e que tem tudo para enfrentar resistência social e parlamentar, apesar de o atual Congresso ser o mais conservador desde o fim da ditadura militar.
Um sinal da dificuldade que o governo provisório terá foi visto horas depois de Temer mandar ao Congresso, na quarta-feira 15, uma proposta de mudança na Constituição que engessa investimentos em saúde e educação por 20 anos.
No Senado, Omar Aziz (AM), voto pró-impeachment e líder do PSD, partido governista, disse no plenário que “as prioridades do governo têm que ser baseadas em três questões: saúde, educação e segurança”. Depois, comentou com a reportagem que votaria contra a proposta engessadora dos gastos. “O governo não pode usar a recessão para justificar cortes no Mais Médicos, no Fies.”
O interino sabe que o debate é delicado. Estudava convocar uma cadeia de rádio e TV para defender seus planos, mas por ora deixou de lado a ideia depois de a explosivadelação de Sergio Machado contra peemedebistas, Temer incluído, vir a público.
Ao anunciar a proposta limitadora de gastos, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, classificou-a de “dura” e admitiu que o foco era conter as despesas com saúde e educação, ambas vinculadas à evolução da arrecadação federal.
Este tipo de proposta não encontra respaldo em uma sociedade desigual como a brasileira, a esperar iniciativas públicas geradoras de melhores condições de vida e oportunidade, na visão do cientista político Carlos Ranulfo, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “Engessar gastos com saúde e educação? Eles estão loucos”, diz.
Para ele, só um governo como o de Temer, nascido não de votos na urna, mas do voto parlamentar, via impeachment, poderia apresentar tal agenda. “Para ganhar eleição no Brasil, tem que ter um discurso que se conecte com a desigualdade”, afirma.
“Com tanta desigualdade, o Brasil não comporta um governo radical de direita”, disse Ranulfo ao participar nesta sexta-feira 17, na Câmara dos Deputados, do seminário “30 Anos de Presidencialismo de Coalizão no Brasil”.
Apesar da impopularidade de seus propósitos, o interino tem uma vantagem para tentar colocá-los em prática: sua declarada intenção de não disputar a reeleição em 2018. Nem poderia concorrer, aliás, ao menos segundo a Procuradoria Eleitoral, que o declara ficha-suja.
Mas será que Temer conseguirá se tornar um presidente efetivo e concluir até 2018 o mandato que pertencia a Dilma Rousseff? Entre adversários do impeachment, há quem veja nos impopulares planos do peemedebista munição a ser usada contra a permanência dele no cargo.
É o caso da senador Lídice da Mata (PSB-BA), frequentadora de reuniões com Dilma no Palácio da Alvorada nas quais se discutem formas de derrotar o impeachment. “A pauta do governo Temer vai nos ajudar”, diz. “A proposta do teto de gastos é muito dura, engessa governos futuros. No Senado haverá muita resistência.”
Para Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, onde o apoio a Temer é menor do que na Câmara, a proposta é tão complexa, que deveria ser debatida só após o desfecho do impeachment.
“Não é recomendável neste momento discutir essas matérias importantes que tratam do ajuste fiscal ou que poderão aprofundar o ajuste, porque estamos vivendo uma transitoriedade”, disse o senador na véspera de o projeto ser enviado pelo Palácio do Planalto.
Em breve o Planalto mandará também ao Congresso uma reforma da Previdência, para instituir idade mínima às aposentadorias. Segundo pesquisa Vox Populi feita de 7 e 9 de junho por encomenda da CUT, 77% dos brasileiros acham que é uma medida ruim e prejudicial às pessoas.
http://www.cartacapital.com.br/politica/plano-temer-sofrera-resistencia-social-e-parlamentar?ref=yfp