Dois dias depois de quase 4 milhões de pessoas tomarem as ruas do país para protestar contra o governo da presidente Dilma Rousseff (PT), a crise política que parece não ter fim ganhou mais um capítulo com a divulgação, pelo Supremo Tribunal Federal, do teor da delação premiada do senador Delcídio do Amaral (PT-MS). Em depoimento de 254 páginas, o parlamentar colocou na linha de tiro os principais nomes da política nacional: a presidente Dilma Rousseff (PT), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), integrantes do governo, parlamentares, empresários, advogados e o presidente do maior partido de oposição ao Palácio do Planalto, o senador mineiro Aécio Neves (PSDB).
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Do documento homologado nessa terça-feira (15) pelo ministro do STF Teori Zavascki veio a público a transcrição de uma gravação de conversa em que o ministro da Educação, Aloízio Mercadante, tenta convencer Delcídio a não firmar o acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República (PGR) ao oferecer ajuda “política e financeira”. Os diálogos ocorreram em dezembro do ano passado, com um assessor de confiança do senador, José Eduardo Marzagão, que gravou e entregou o conteúdo à PGR – responsável pelas investigações do envolvimento de políticos no esquema de corrupção na Petrobras, a chamada Operação Lava-Jato. Aloízio Mercadante rapidamente convocou uma coletiva em que negou a acusação e declarou ter interesse na investigação do fato. Ainda reclamou da omissão de trechos da conversa que poderiam comprovar sua versão.
O envolvimento de Mercadante levou parlamentares da oposição a cobrar da PGR um pedido de prisão do ministro – que até o fechamento desta edição não havia sido discutido. E as declarações do petista atiçaram ainda mais Delcídio, que veio a público com outra revelação bombástica: depois de ficar 87 dias preso sob a acusação de tentar atrapalhar as investigações da Operação Lava-Jato, afirmou que agiu a mando de Dilma – de quem foi líder no Senado – e Lula. Em entrevista ao jornal O Globo, ele foi categórico: “Cadê o governo que se dizia republicano, que nada interferiria nas investigações? A gravação do Aloizio confirma o que eles sempre negaram. Na minha delação fica claro que fui escalado, como líder do governo, pela Dilma e pelo Lula para barrar a Lava-Jato.” Ainda nessa terça-feira (15), o senador, que já estava afastado do partido, pediu desfiliação do PT.
O vice-presidente Michel Temer (PMDB) foi acusado por Delcídio do Amaral de participar de um suposto escândalo de aquisição ilícita de etanol na BR Distribuidora, entre 1997 e 2001. O operador do esquema seria João Augusto Rezende Henriques, ex-diretor da subsidiária, que fez depósitos apontados pela Lava-Jato como propina para o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em 2011. Segundo a delação de Delcídio, Henriques era “apadrinhado” de Temer. De acordo com a assessoria, Michel Temer “nunca foi padrinho” de João Henriques, não o conhecia quando foi indicado ao cargo, pois a indicação foi pela bancada do PMDB.
Em outro trecho da delação, são citados o presidente do Senado, Renan Calheiros, e o ministro do STF Ricardo Lewandowski. Em conversa gravada por um assessor dele, funcionário de Mercadante teria levado o recado de que o ministro da Educação prometia interceder junto ao ministro e a Renan para elaborar uma maneira de fazer com que os senadores revogassem o aval da Casa para que fosse preso. As assessorias do STF e de Renan negaram as declarações.
Em relação ao senador Aécio Neves, Delcídio disse que o mineiro foi beneficiário de um “grande esquema de corrupção em Furnas”, operacionalizado por Dimas Toledo, ex-diretor de engenharia de Furnas, e que teria “vínculo muito forte” com Aécio. Em nota, o senador negou as citações, que chamou de “mentirosas”, e que não se “sustentam na realidade”.